Elton Alisson |
Agência FAPESP – Pesquisadores do
Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) desenvolveram uma
metodologia para mapear áreas suscetíveis a deslizamentos de terra em
municípios brasileiros a partir de dados e softwares de domínio público.
Desenvolvida no âmbito do Projeto Temático
“Assessment of impacts and vulnerability to climate change in Brazil and strategies for adaptation option”, realizado com apoio da FAPESP, a metodologia foi descrita em um artigo publicado na revista
Natural Hazards and Earth System Sciences.
Sistema usa dados e softwares livres e pode auxiliar municípios que ainda não possuem levantamentos de regiões vulneráveis (
foto:IPT)
“A ideia de usar dados e softwares livres foi para possibilitar que a
metodologia possa ser utilizada de forma prática e confiável por
gestores públicos de municípios brasileiros que ainda não possuem
mapeamentos de áreas suscetíveis a deslizamentos de terra e que muitas
vezes sofrem com esse tipo de problema”, disse Pedro Ivo Camarinha,
doutorando no Inpe e um dos autores da metodologia, à
Agência FAPESP.
A metodologia utiliza um sistema de processamento de informações georreferenciadas chamado
Spring,
desenvolvido pelo Inpe e disponibilizado gratuitamente na internet,
além de um banco de dados geomorfométricos do Brasil, denominado
Topodata, também criado pelo Inpe a partir de dados da missão Shuttle Radar Topography Mission (SRTM).
Realizada em fevereiro de 2000 pelo ônibus espacial Endeavour, da
agência espacial americana (Nasa), a SRTM teve o objetivo de obter a
mais completa base de dados topográficos digitais e de alta resolução da
Terra por meio de um sistema de radar.
“O Topodata conseguiu melhorar a resolução dos dados de topografia
fornecidos pela SRTM – que era de 90 metros – para toda a América do Sul
e, especialmente para o Brasil, oferecendo ao usuário uma série de
dados topográficos com resolução espacial de 30 metros”, disse
Camarinha.
“Isso colabora para elaboração de mapas de suscetibilidade a
deslizamentos de terra de municípios brasileiros com resolução
aceitável”, avaliou.
Serra do Mar
A fim de avaliar sua confiabilidade, a metodologia foi usada
inicialmente para estimar a suscetibilidade e riscos de deslizamento de
terra nos municípios de Caraguatatuba, Ubatuba, Santos e Cubatão,
situados na região da Serra do Mar, no litoral paulista.
De importância estratégica para a economia do estado e do país em
razão de concentrar portos, estradas, oleodutos e gaseodutos, além de
serem centros turísticos, os quatro municípios registram frequentemente
desastres naturais envolvendo deslizamentos de terra devido, entre
outros fatores, às características geofísicas e ao crescimento
populacional desordenado, que levou à ocupação de áreas próximas a
encostas e morros.
Por essas razões, essas quatro cidades têm sido consideradas
prioritárias nos mapeamentos de áreas de risco de deslizamentos feitos
pelo Serviço Geológico do Brasil (CPRM) – o órgão oficial de
assessoramento dos municípios e da Defesa Civil na gestão de riscos de
desastres naturais.
“Os municípios de Caraguatatuba, Ubatuba, Santos e Cubatão já contam
com um mapeamento de áreas suscetíveis a deslizamentos de terra,
elaborado pelo CPRM, devido a seus históricos de desastres naturais
relacionados a esse tipo de processo geológico”, disse Camarinha.
Ao comparar o levantamento de suscetibilidade a deslizamento de terra
feito com a metodologia desenvolvida pelo Inpe com o levantamento de
áreas de risco de deslizamento realizado pelo CPRM nesses quatro
municípios, os pesquisadores constataram que a metodologia é bastante
eficiente.
Além de áreas de risco de deslizamentos de terra já identificadas
pelo CPRM em campo, a metodologia indicou que há regiões com
suscetibilidade alta e muito alta nos quatro municípios situadas, em sua
maioria, em áreas de expansão urbana.
“A metodologia que desenvolvemos foi capaz de identificar com
considerável precisão onde estão localizadas as áreas de risco de
deslizamento de terra nos quatro municípios analisados”, afirmou
Camarinha.
“Ela pode ser usada tanto em cidades que já possuem mapeamento de
suscetibilidade a deslizamento de terra para reforçar e nortear as
análises feitas
in loco pelo CPRM, como também por municípios que ainda não têm esse tipo de levantamento”, afirmou.
Levantamento nacional
De acordo com a The International Emergency Disasters Database
(EM-DAT) – uma base de dados de desastres ocorridos em todo o mundo
desde 1900 –, no período de 1900 a 2013 foram registrados 150 grandes
desastres naturais no Brasil, que afetaram 71 milhões de pessoas,
causaram mais de 10 mil mortes e perdas estimadas em US$ 16 bilhões.
Devido ao aumento da frequência e intensidade de desastres naturais
relacionados a deslizamentos de terra nas cidades brasileiras nas
últimas duas décadas – especialmente nas regiões Sudeste e Sul do país
–, o CPRM começou a realizar a partir de 2013, por solicitação do
governo federal, um mapeamento de suscetibilidade, perigo e risco em 821
municípios considerados prioritários por registrarem o maior número de
ocorrências.
O trabalho vem avançando nos últimos anos, mas ainda há uma série de
municípios prioritários que ainda não possuem esse tipo de mapeamento,
apontou Camarinha.
“Além desses municípios considerados prioritários, há uma série de
outros onde também ocorrem deslizamentos de terra, mas com menor
frequência e intensidade”, afirmou.
“Para esses casos, a metodologia que desenvolvemos pode auxiliar a
Defesa Civil e secretarias municipais que tratam de riscos de desastres
naturais a fazer um planejamento urbano melhor, como também identificar
áreas de risco a deslizamentos de terra”, avaliou
Além de Caraguatatuba, Ubatuba, Santos e Cubatão, após ser validada, a
metodologia também foi usada para avaliar a suscetibilidade a
deslizamento de terra em cerca de outros 60 municípios paulistas,
situados na Baixada Santista, Litoral Norte, região metropolitana de
Campinas, Serra da Mantiqueira e no Vale do Paraíba.
Os pesquisadores também estão avaliando a possibilidade de adaptar a
metodologia para analisar áreas de risco suscetíveis à inundação, que
representa o tipo de desastre natural mais frequente (58% do total) e
que causa maior número de óbitos no Brasil, seguido por deslizamentos de
terra (15,6%), segundo o Atlas Brasileiro de Desastres Naturais,
elaborado pelo Centro Universitário de Estudos e Pesquisas sobre
Desastres (Ceped) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).