Por Fábio Feldmann
Na semana passada, participei de uma reunião na ANA – Agência
Nacional de Águas, promovida em conjunto com a Associação Brasileira de
Recursos Hídricos, com o objetivo de se discutir a crise que o país
atravessa. Falta de água em importantes regiões metropolitanas,
enchentes na região Norte, enfim, uma situação dramática, a ponto da
reunião ter sido interrompida, em um determinado momento, para que se
“celebrasse” a chuva na Serra da Cantareira em São Paulo.
Todos os presentes no encontro, representando o que há de mais
expressivo em termos do assunto no Brasil, foram unânimes em seu
diagnóstico. Se de um lado houve avanços no país com a edição da
Política Nacional de Recursos Hídricos e com a criação da ANA logo em
seguida, de outro há um incontestável desmantelamento do sistema
nacional de recursos hídricos e dos sistemas estaduais.
E o pior, o desmantelamento é democrático e absolutamente
suprapartidário, abrangendo vários estados: Ceará (ex-PSB, atual PROS),
Rio Grande do Norte (DEM), Bahia (PT), Minas Gerais (PSDB), São Paulo
(PSDB), Paraná (PSDB), Santa Catarina (PSD) e Rio Grande do Sul (PT).
Vale a pena registrar que o Ceará e Rio Grande do Norte haviam se
tornado “cases” internacionais pelo fato de serem exemplos bem sucedidos mundialmente.
A pergunta não respondida diz respeito a se tentar explicar os
porquês de tal esvaziamento institucional. Falta de vontade política?
Cultura de não implementação da Lei no Brasil? Falta de mobilização da
sociedade?
Na reunião ficou evidente que há um déficit inequívoco de gestão e
que as respostas à crise são unicamente obras vultosas. Embora
impactantes no curto prazo, as mesmas não representam soluções
permanentes e sequer atenuam os cenários futuros de aumento de demanda
de água.
O Brasil está regredindo a passos largos na sua capacidade de
gerenciar um dos recursos mais importantes e estratégicos do mundo e,
com isso, estamos transferindo um enorme ônus para as futuras gerações.
Estas irão pagar contas de luz e água mais caras e a nossa economia,
certamente, perderá as vantagens comparativas que possui no que tange à
disponibilidade de água em quantidade e qualidade.
É isso que queremos? O que tem a dizer os economistas que pensam o Brasil do futuro?
A esse diagnóstico sombrio, somam-se outras dificuldades. Os esforços
de proteção da Mantiqueira são minados por argumentos burocráticos,
levantados também suprapartidariamente, de modo que a possibilidade de
se proteger a fábrica de água responsável pelo abastecimento dos três
estados mais populosos do país corre o risco de entrar em colapso.
A criação de um Parque Nacional está fora de cogitação pelo Governo
Federal. Por sua vez, o Condephaat – Conselho de Defesa do Patrimônio
Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico, em São Paulo, abre mão
do tombamento de áreas naturais e o governo de Minas Gerais não pensa em
criar nenhuma Unidade de Conservação que possa proteger essas porções
territoriais.
Enquanto isso acontece por aqui, Nova Iorque investe na aquisição de
florestas distantes para garantir a água que abastece seus cidadãos.
Certamente, não podemos desperdiçar a água e esta crise: nossos filhos
irão nos cobrar.
Artigo publicado no jornal Brasil Econômico em 6 de março de 2014.
Nota: Recomendamos leitura de Água, por Marq de Villiers
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