Agência FAPESP – Estudos recentes indicaram que os organismos
marinhos que vivem em ambientes pobres em nutrientes serão mais
suscetíveis aos impactos causados pelas mudanças climáticas globais nos
oceanos.
Isso porque, como teriam menor disponibilidade de nitrogênio e
fósforo, entre outros nutrientes, nos lugares onde vivem, possuiriam
mecanismos de resistência mais frágeis do que os que estão em áreas com
maior disponibilidade desses “alimentos”. Em função disso, seriam mais
vulneráveis ao aumento de até 4 graus Celsius na temperatura da água dos
mares e à diminuição em até 0,6 unidade da acidez (pH) projetada para
este século.
Uma série de experimentos com algas realizados por pesquisadores de
cinco continentes, com a participação de seis brasileiros, corroborou
essas observações. O grupo constatou que algas que ocorrem em ambientes
pobres em nutrientes são mais suscetíveis às alterações de temperatura,
pH e radiação ultravioleta, provocadas pelas mudanças climáticas, do que
as que ocorrem em lugares com maior disponibilidade de nutrientes.
Em função disso, com o aumento da temperatura e diminuição da acidez
das águas dos mares, podem ocorrer mudanças nas comunidades de algas
estruturadoras de habitats, diminuindo a produtividade primária (de
organismos que fazem fotossíntese). Consequentemente, a contribuição dos
oceanos para mitigar os efeitos das mudanças climáticas será reduzida
porque as algas são algumas das principais protagonistas no sequestro de
dióxido de carbono.
“Alguns estudos já haviam apontado essas hipóteses, que corroboramos
agora por meio de uma série de experimentos realizados em diferentes
condições”, disse Fanly Fungyi Chow Ho, pesquisadora do Laboratório de
Algas Marinhas “Édison José de Paula”, do Departamento de Botânica do
Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (USP), e uma das
participantes do estudo, à Agência FAPESP.
Os experimentos foram realizados durante o 9º Workshop Internacional
do Grupo de Produtividade Primária Aquática (GAP), que ocorreu no final
de setembro em Málaga, na Espanha. Organizado pela Universidade de
Málaga e pelo Instituto Espanhol de Oceanografia, em parceria com a
Sociedade Internacional de Limnologia, o conceito do workshop foi
diferente dos eventos científicos convencionais.
Em vez de apresentação de conferências, painéis e mesas-redondas, as
atividades do encontro científico foram voltadas para a realização de
trabalhos experimentais em campo, em tanque e em laboratório, planejados
com antecedência de um ano e com o objetivo definido de entender melhor
os impactos das mudanças climáticas globais sobre espécies de macro e
microalgas.
Para realizar os experimentos, os cerca de 100 pesquisadores e
estudantes de graduação e pós-graduação participantes do evento foram
distribuídos em quatro grupos de trabalho. Dois grupos realizaram
experimentos em tanque e em campo, nas águas costeiras de Málaga, para
analisar as respostas químicas e fisiológicas de macro e microalgas a
condições de estresse ambiental.
Outros dois grupos – um dos quais integrados por Chow Ho – realizaram
experimentos nos quais foram colocadas amostras das algas coletadas em
aquários com diferentes concentrações de nutrientes e condições de
temperatura, acidez da água e de radiação UV, para simular as condições
que podem ocorrer no ambiente com as mudanças climáticas.
Paralelamente, foi mensurada uma série de parâmetros de respostas
fisiológicas das algas a essas variações, como crescimento, capacidade
de realização de fotossíntese e produção de componentes bioquímicos de
interesse biotecnológico, como antioxidantes e pigmentos.
Os resultados preliminares das análises apontaram que as mudanças de
acidez, da temperatura e da disponibilidade de nutrientes na água
alteraram as capacidades de realizar fotossíntese, de crescimento e de
produção de compostos pelas algas. Por outro lado, a diminuição da
disponibilidade de nutrientes na água pode ser útil para melhorar as
características fisiológicas e bioquímicas de algumas microalgas de
interesse biotecnológico.
Experimentos em laboratório realizados pelos pesquisadores durante o evento com microalgas Chlorella revelaram
que o crescimento da alga – usada como complemento alimentar devido ao
alto poder antioxidante e muito visada como matéria-prima para o
desenvolvimento de biocombustíveis e para biorremediação de águas
residuais – é pouco afetado por alterações provocadas por mudanças
climáticas. Além disso, a alga é capaz de acumular mais lipídeos de
interesse alimentar e energético quando submetidas a baixas condições de
nutrientes.
“A diminuição da quantidade de nutrientes na água pode ser benéfica
para aumentar a produção de biomassa dessas microalgas”, avaliou Chow
Ho, que já teve diversos projetos apoiados pela FAPESP e realiza
atualmente uma pesquisa em que estuda a fisiologia integrativa de macroalgas frente a condições de estresse.
Resultados inéditos
Alguns dos resultados dos estudos colaborativos realizados pelo grupo
de pesquisadores internacionais foram apresentados e discutidos no
evento. Outros resultados estão em análise e deverão ser publicados em
2013 em um volume especial da revista Aquatic Biology com cerca de 15 artigos.
“Os resultados inéditos demandarão mais tempo para serem gerados
porque necessitarão de uma análise mais profunda em laboratório do que a
que conseguiríamos fazer ao longo de dez dias de duração do evento”,
explicou Chow Ho.
Ao todo, os pesquisadores coletaram aproximadamente 9 mil amostras de
algas e 10 mil dados durante o evento, que deverão ser submetidas a
análises químicas, genômicas e transcriptômicas em laboratórios na
Irlanda, Estados Unidos, França e Espanha durante o ano de 2013. O grupo
de pesquisadores brasileiros participará das análises estatísticas e
das tabulações dos resultados.
Além de Chow Ho participaram do evento e da realização dos
experimentos os pesquisadores brasileiros Cristina Nassar e Rodrigo
Mariath, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), José Bonomi
Barufi, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Margareth
Copertino, da Universidade Federal do Rio Grande (FURG), e Moacir
Aluísio Torres, da Universidade Estadual de Santa Catarina (UESC). Barufi e Torres fizeram mestrado com Bolsa da FAPESP.
Por Elton Alisson
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