Elton Alisson   |  Agência FAPESP – As previsões de 
eventos extremos de tempo e clima no Brasil, como chuvas intensas e 
períodos de seca causados pelo El Ninõ –  o aquecimento anormal das 
águas superficiais e sub-superficiais do Oceano Pacífico Equatorial –, 
podem se tornar mais assertivas nos próximos meses.
O Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC) do 
Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) começou a realizar este
 ano previsões de tempo em escala mundial (de um a sete dias) com um 
novo modelo atmosférico de circulação global.
Denominado BAM (Brazilian Global Atmospheric Model), o modelo foi 
desenvolvido totalmente no país ao longo dos últimos quatro anos por 
pesquisadores da Divisão de Modelagem e Desenvolvimento (DMD) do 
CPTEC-Inpe.
O BAM será a componente atmosférica do Modelo Brasileiro do Sistema 
Terrestre (BESM, na sigla em inglês), desenvolvido para projeções de 
mudanças climáticas, com apoio da FAPESP (leia mais).
O modelo deverá ser acoplado ao BESM este ano para ser usado não 
somente em projeções de mudanças climáticas, mas também para a previsão 
de clima sazonal (até três meses).
“Adquirimos muita experiência no desenvolvimento da dinâmica e de 
processos físicos em modelos atmosféricos globais e, como o modelo 
atmosférico anterior ao BAM usado pelo CPTEC que estava em operação 
desde 2010 não era mais adequado para resoluções espaciais menores ou 
iguais a 20 quilômetros, decidimos desenvolver um novo modelo mais 
adaptado para essas resoluções e às condições climáticas da América do 
Sul”, disse Silvio Nilo Figueroa, chefe da DMD do CPTEC-Inpe e 
integrante do projeto, à Agência FAPESP.
De acordo com Figueroa, uma das limitações dos modelos globais 
americanos, europeus e de outros centros mundiais de meteorologia é não 
representar muito bem duas forçantes (mudanças impostas no balanço de 
energia planetária que, tipicamente, causam alterações na temperatura 
global) que têm forte influência no tempo e clima da América do Sul: a 
forçante topográfica, associada aos Andes, e a forçante térmica, devido à
 liberação de calor latente das nuvens na Amazônia.
“A maioria dos modelos numéricos atmosféricos globais falha na 
representação da cordilheira dos Andes devido ao fato de que elas é 
muito estreita e sua altura varia  abruptamente em poucos quilômetros de
 distância”, afirmou.
Esse problema matemático tem um impacto muito grande no transporte da
 umidade da Amazônia para o Sul e o Sudeste do país e, consequentemente,
 na previsão de tempo e de clima sazonal especialmente para estas duas 
regiões, explicou o pesquisador.
“Ao melhorar nosso modelo climático atmosférico global para 
representar melhor as regiões montanhosas da América do Sul e a formação
 das nuvens na Amazônia será possível melhorar as previsões de tempo e 
de clima sazonal no Brasil. Esse será nosso grande diferencial com 
relação a outros modelos globais e uma contribuição brasileira à 
comunidade cientifica internacional”, estimou Figueroa.
Segundo o pesquisador, com o BAM também será possível melhorar a representação de chuva na Amazônia.
Por meio de projetos que estão sendo realizados na Amazônia, como o Projeto Chuva e a campanha científica Green Ocean Amazon GOAmazon
 – ambos com apoio da FAPESP –, será possível ajustar o BAM para 
melhorar a representação da formação de nuvens na Amazônia, apontou.
“Com a melhoria da representação tanto da Amazônia como dos Andes no 
modelo será possível fazer previsões de tempo e de clima com melhor 
confiabilidade e qualidade para a região Sudeste”, avaliou.
Melhor resolução
Outro avanço apresentado pelo BAM, segundo Figueroa, será no aumento 
da resolução espacial com a qual as previsões de tempo e clima feitas 
pelo CPTEC passarão a ser processadas.
O modelo atmosférico de circulação global usado até então pela 
instituição – o AGCM3 – processava as previsões com resolução espacial 
de 45 quilômetros (km) e 64 camadas na vertical.
Já o BAM processa as previsões com resolução espacial de 20 km e 96 camadas na vertical.
O aumento da resolução espacial do modelo possibilita representar 
melhor a topografia, a dinâmica (equações do movimento da atmosfera) e a
 física (radiação, camada, limite, processos de superfície e 
microfísica) da América do Sul.
Além disso, realizará previsões de tempo com mais de dois dias de 
antecedência – algo que o modelo anterior não permitia, comparou 
Figueroa.
“O modelo antigo apresentava uma queda de desempenho a partir do 
segundo dia de previsão. Com o BAM conseguimos fazer previsões de tempo 
com mais dias de antecedência e maior nível de confiança”, afirmou.
O BAM ficou em modo experimental durante um ano e em fase pré-operacional nos últimos três meses.
Durante esse período, os pesquisadores fizeram uma avaliação de 
desempenho do modelo para previsão de chuva sobre a região Sudeste.
Os resultados da avaliação indicaram que as previsões feitas com o 
modelo apresentaram níveis de qualidade similares às geradas pelo modelo
 Global Forecast System (GFS), do National Center for Environmental 
Prediction (NCEP), dos Estados Unidos – considerado um dos melhores 
modelos em operação no mundo.
“O BAM conseguiu prever com vários dias de antecedência as fortes 
chuvas que ocorreram na região no mês passado causadas pela Zona de 
Convergência do Atlântico Sul [banda de nebulosidade que se estende desde o sul da região Amazônica até a região central do Atlântico Sul]”, disse Figueroa.
De acordo com o pesquisador, as previsões feitas pelo BAM abrangem 
grandes áreas do globo, da ordem de 20 quilômetros. Por isso, podem não 
capturar indícios de mudanças do tempo para uma região menor, da ordem 
de poucos quilômetros, como um município da região metropolitana de São 
Paulo.
Para realizar previsões de tempo para essas áreas menores os modelos 
mais indicados são os regionais, com resolução espacial entre 1 e 10 km,
 como o ETA e o BRAMS usados pelo CPTEC.
Os modelos globais como o BAM, contudo, servem aos modelos regionais 
como condições de contorno (informam as condições atmosféricas na divisa
 das regiões abrangidas pelos modelos regionais). Dessa forma, a 
qualidade das previsões dos modelos regionais depende também em parte da
 qualidade das condições atmosféricas previstas pelo modelo global, 
ponderou o pesquisador.
“São os modelos atmosféricos globais que fornecem a temperatura, o 
vento e outras variáveis nas bordas dos modelos regionais em intervalos 
de três a seis horas para que os modelos regionais consigam fazer 
previsões para um dia o mais dentro de suas respectivas áreas de 
domínio”, afirmou.
O BAM, por exemplo, fornecerá condições de contorno para os modelos 
regionais de um quilômetro que serão usados como forçante  para 
previsões de ondas e correntes para a Baía de Guanabara durante as 
Olimpíadas do Rio de Janeiro, disse Figueroa.
Capacidade de computação
Segundo o pesquisador, o BAM está pronto para rodar com uma melhor 
resolução espacial, de 10 quilômetros. Uma das limitações para rodar o 
modelo com essa resolução, contudo, é a falta de capacidade 
computacional.
A capacidade computacional do supercomputador Tupã, adquirido no 
final de 2010 pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e
 a FAPESP e instalado no CPTEC, já está no limite, de acordo com 
Figueroa (leia mais).
Um teste  realizado pelos pesquisadores do CPTEC para avaliar o 
desempenho do atual supercomputador para processar o modelo BAM, 
adaptado a uma resolução espacial de 10 quilômetros, demonstrou que 
mesmo utilizando toda a capacidade de processamento do supercomputador 
Tupã, fazendo uso de seus 30 mil processadores ao longo de duas horas, 
foi possível gerar previsões para apenas 24 horas.
Com um computador novo 28 vezes mais potente, por exemplo, demoraria 
aproximadamente uma hora para fazer previsões até com sete dias de 
antecedência, comparam os pesquisadores.
Dessa forma, o atual supercomputador é incapaz de gerar previsões 
operacionais para até sete dias, sendo limitado também para realizar 
previsões de clima sazonal com alta resolução espacial, apontou 
Figueroa.
“O máximo que conseguimos com o Tupã hoje é rodar o BAM com resolução
 espacial de 20 quilômetros. Mas se tivéssemos maior capacidade 
computacional conseguiríamos rodar o modelo com resolução espacial de 10
 quilômetros”, disse.
Já o BESM – do qual o BAM será uma das componentes principais, a 
atmosférica – está rodando hoje com resolução espacial de 180 
quilômetros, aproximadamente.
O ideal, de acordo com o pesquisador, é que o modelo do sistema 
terrestre para mudanças climáticas e previsão sazonal rode com 100 
quilômetros ou menos de resolução espacial.
“Quanto melhor a resolução espacial do modelo, melhor também é a 
capacidade de representar a topografia, como vales e montanhas, e o 
contraste entre mar e continente. Com resolução espacial de 180 estes 
contrastes não são bem definidos, e a praia pode parecer terra”, 
exemplificou Figueroa.
Segundo o pesquisador, hoje instituições como o NCEP, dos Estados 
Unidos, por exemplo, tem capacidade para rodar seu modelo global 
atmosférico de tempo a uma resolução espacial de 13 quilômetros, usando 
supercomputadores entre 30 e 50 vezes mais velozes que o Tupã –  na 
ordem de PetaFlops ou 1015 operações de ponto flutuante por segundo.
“A tendência é que nos próximos cinco a sete anos os modelos globais 
estejam rodando com 1 a 2 quilômetros de resolução espacial. Aí não será
 mais necessário usar modelos regionais, porque a topografia de uma 
região, como o Vale do Paraíba, estará muito bem representada nos 
modelos globais”, estimou Figueroa.
A ideia é que o BAM represente o início do desenvolvimento da futura 
geração do modelo global atmosférico do CPTEC-Inpe, em que o mesmo 
modelo será usado para a previsão de tempo global, com resolução menor 
de 5 km, e para clima sazonal e mudanças climáticas, com resoluções da 
ordem de 10 a 25 km, afirmou o pesquisador.
 
 
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