Por Heitor Shimizu, de Munique
Agência FAPESP – Pesquisadores da Alemanha e do Brasil se reuniram na FAPESP Week Munich,
no dia 17 de outubro, em um painel para apresentar e debater desafios,
soluções e oportunidades em energias renováveis e sustentáveis.
“Vivemos um momento de grande crescimento no mundo como um todo,
tanto populacional como econômico, mas não observamos um crescimento
proporcional no uso de energias renováveis. A fonte energética que mais
cresce é o carvão, o que diz muito sobre a situação que vivemos
atualmente”, disse Thomas Hamacher, professor na Universidade Técnica de
Munique, moderador do painel e um dos palestrantes.
“Nos últimos anos, as emissões derivadas de combustíveis fósseis têm
aumentado mais do que achávamos que fosse ocorrer. Se olharmos para os
cenários produzidos pelo IPCC [Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas] no início da década de 1990, vemos que estamos hoje no lado do pior cenário estimado na época”, disse Hamacher.
“Energia é um assunto muito importante no cenário político atual e
esses são pontos com os quais temos que lidar. Temos de encontrar
soluções globalmente e não individualmente. Não temos uma resposta
ainda, mas certamente um caminho é trabalhar mais com energias
renováveis”, afirmou.
Hamacher destacou a importância para a Alemanha da questão da chamada
“energiewende” (“transição energética”), que visa à substituição do
carvão e de derivados do petróleo por fontes renováveis.
No Brasil, país considerado exemplar no uso de energias renováveis –
em especial por conta da geração de eletricidade por hidrelétricas e
pelo uso do etanol como combustível em veículos –, a pesquisa na área
também tem sido intensa.
Um exemplo está no Programa FAPESP de Pesquisa em Bioenergia (BIOEN),
que foi apresentado no painel no Deutsches Museum, em Munique, por um
dos membros de sua coordenação, Marie-Anne van Sluys, professora no
Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo.
Lançado em 2008, o BIOEN tem como objetivo estimular e articular
atividades de pesquisa e desenvolvimento, utilizando laboratórios
acadêmicos e industriais para promover o avanço do conhecimento e sua
aplicação em áreas relacionadas à produção de bioenergia no Brasil.
“Levando em conta que o programa se encontra em um cenário muito
amplo, ele foi criado com cinco divisões, bem diferentes entre elas”,
disse Van Sluys. As divisões do BIOEN estão voltadas para pesquisas em:
biomassa para bioenergia; fabricação de biocombustíveis; biorrefinarias e
alcoolquímica; aplicações do etanol para motores automotivos; e
impactos socioeconômicos e ambientais e uso da terra.
“O BIOEN está focado tanto no conhecimento básico como na geração de
novas tecnologias. A participação tem sido muito expressiva. O programa
já teve 136 auxílios a pesquisa, envolvendo mais de 400 pesquisadores no
Brasil e colaboradores em 15 países, entre os quais a Alemanha”, disse
Van Sluys.
Van Sluys destacou que o BIOEN estimulou a criação do Centro Paulista
de Pesquisa em Bioenergia, do Programa Integrado de Pós-Graduação em
Bioenergia (que reúne as três universidades estaduais paulistas) e a
realização de parcerias em pesquisa com empresas e instituições de
diversos países.
O BIOEN também deu origem a 15 projetos de pesquisa apoiados por meio
do Programa FAPESP Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE) e a 12 projetos no Programa de Apoio à Pesquisa em Parceria para Inovação Tecnológica (PITE).
Van Sluys falou sobre a importância de fazer com que a cana-de-açúcar
se torne um componente ainda mais importante na matriz energética
brasileira. Por conta disso, pesquisadores ligados ao BIOEN têm estudado
alternativas que permitam aumentar a eficiência da cana na produção de
energia.
O grupo liderado por Van Sluys na USP, por exemplo, integra um
consórcio internacional de pesquisadores que trabalha no sequenciamento e
análise do genoma da cana-de-açúcar e que publicou recentemente um
conjunto amplo e diverso de sequências do genoma da planta.
Energia fotovoltaica
Uma alternativa considerada importante na Alemanha para a
“energiewende” é o uso da energia solar. Roland Zink, professor no
Instituto de Tecnologia de Deggendorf, falou sobre a pesquisa realizada
por seu grupo a respeito do uso de energia fotovoltaica na Baviera.
“A instalação de painéis fotovoltaicos, subsidiada pelo governo desde
o ano 2000, experimenta um forte crescimento na Alemanha. Muitos
sistemas têm sido instalados em telhados e temos visto a implantação de
usinas de larga escala para geração de eletricidade”, disse Zink.
“Áreas rurais, como no sudeste da Baviera, têm percebido o potencial
das energias renováveis como uma oportunidade de desenvolvimento
econômico”, afirmou o pesquisador.
Segundo ele, essa espécie de corrida pelo uso da energia fotovoltaica
tem levado a região a experimentar problemas tanto técnicos como
sociais. Um problema técnico importante é a instalação não planejada dos
sistemas, envolvendo fatores como a escolha de locais menos favoráveis,
seja espacial ou economicamente.
O principal problema social, contou Zink, diz respeito às estações de
grande porte, que reduzem as áreas de cultivo, já escassas na região,
preocupando os agricultores.
O painel sobre energia na FAPESP Week Munich também contou com
apresentações dos professores Jürgen Karl (Universidade de
Erlangen-Nuremberg), Gilberto De Martino Jannuzzi (Faculdade de
Engenharia Mecânica da Universidade Estadual de Campinas) e Denis Coury
(Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo).
Karl falou sobre combustíveis renováveis e alternativas de
armazenamento. Segundo ele, o uso de energias renováveis tem crescido na
Alemanha, respondendo atualmente por mais de 30% da produção de energia
no país e substituindo com sucesso as fontes nucleares e o gás natural
importado principalmente da Rússia.
“À medida que o uso das fontes renováveis aumentar, precisaremos de
capacidades de armazenamento que permitam, por exemplo, manter a energia
solar ou do vento não apenas por algumas horas, mas por dias e
semanas”, disse.
Jannuzzi, que também é membro da coordenação do Programa FAPESP de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais (PFPMCG),
falou sobre a flexibilização do sistema energético brasileiro, com o
uso de novas tecnologias e aumento da eficiência energética.
Segundo Jannuzzi, a demanda energética no Brasil tem crescido mais
rapidamente do que o Produto Interno Bruto: 4,5% de 2012 a 2013, contra
2,3% de aumento no PIB. O setor energético, que historicamente é
dependente da geração por hidrelétricas, tem mudado nos últimos anos,
com o crescimento de outras fontes, como o maior uso de termoelétricas.
Coury, que coordena o Projeto Temático "Desenvolvimentos tecnológicos para a proteção, análise, supervisão e automação dos sistemas elétricos do futuro", apoiado pela FAPESP, falou sobre pesquisas conduzidas por seu grupo com “smart grids”.
“Smart grids” são redes de distribuição automatizadas, baseadas em
inteligência computacional e tecnologias da informação. Com uma
comunicação interativa entre as partes, elas permitem otimizar o uso de
energia elétrica.
Nas “smart grids”, uma máquina de lavar, por exemplo, pode ser
programada para funcionar apenas quando receber a informação de que
naquele momento a demanda por energia no sistema caiu abaixo de um
determinado valor. Ou a energia na casa do consumidor pode ter seu preço
aumentado ou diminuído conforme os picos de uso.
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