Por Karina Toledo
Agência FAPESP – Compreender os processos evolutivos,
geológicos, climáticos e genéticos por trás da enorme biodiversidade e
do padrão de distribuição de espécies da Mata Atlântica e, com base
nesse conhecimento, criar modelos que permitam prever, por exemplo, como
essas espécies vão reagir às mudanças no clima e no uso do solo.
Esse é o objetivo central de um projeto que reúne pesquisadores do Brasil e dos Estados Unidos no âmbito de um acordo de cooperação
científica entre o Programa de Pesquisas em Caracterização,
Conservação, Recuperação e Uso Sustentável da Biodiversidade do Estado
de São Paulo (BIOTA-FAPESP) e o programa Dimensions of Biodiversity, da
agência federal norte-americana de fomento à pesquisa National Science
Foundation (NSF).
“Além de ajudar a prever o que poderá ocorrer no futuro com as
espécies, os modelos ajudam a entender como está hoje distribuída a
biodiversidade em áreas onde os cientistas não têm acesso. Como fazemos
coletas por amostragem, seria impossível mapear todos os microambientes.
Os modelos permitem extrapolar essas informações para áreas não
amostradas e podem ser aplicados em qualquer tempo”, explicou Ana
Carolina Carnaval, professora da The City University of New York, nos
Estados Unidos, e coordenadora do projeto de pesquisa ao lado de
Cristina Miyaki, do Instituto de Biociências da Universidade de São
Paulo (IB-USP).
A proposta, segundo Carnaval, é promover a integração de
pesquisadores de diversas áreas – como ecologia, geologia, biogeografia,
genética, fisiologia, climatologia, taxonomia, paleologia,
geomorfologia – e unir ciência básica e aplicada em benefício da
conservação da Mata Atlântica.
O bioma é considerado um dos 34 hotspots mundiais, ou seja,
uma das áreas prioritárias para a conservação por causa de sua enorme
biodiversidade, do alto grau de endemismo de suas espécies (ocorrência
apenas naquele local) e da grande ameaça de extinção resultante da
intensa atividade antrópica na região.
A empreitada coordenada por Carnaval e por Miyaki teve início no
segundo semestre de 2013. A rede de pesquisadores esteve reunida pela
primeira vez para apresentar suas linhas de pesquisa e seus resultados
preliminares na segunda-feira (10/02), durante o “Workshop Dimensions
US-BIOTA São Paulo - A multidisciplinary framework for biodiversity
prediction in the Brazilian Atlantic forest hotspot”.
“Convidamos alguns colaboradores além de pesquisadores envolvidos no
projeto, pois queremos críticas e sugestões que permitam aperfeiçoar os
trabalhos”, contou Miyaki. “Essa reunião é um marco para conseguirmos
efetivar a integração entre as diversas áreas do projeto e criarmos uma
linguagem única focada em compreender a Mata Atlântica e os processos
que fazem esse bioma ser tão especial”, acrescentou.
Entre os mistérios que os cientistas tentarão desvendar estão a
origem da incrível diversidade existente na Mata Atlântica,
possivelmente fruto de conexões existentes há milhões de anos com outros
biomas, entre eles a Floresta Amazônica. Outra questão fundamental é
entender a importância do sistema de transporte de umidade na região
hoje e no passado e como ele permite que a Mata Atlântica se comunique
com outros sistemas florestais. Também está entre as metas do grupo
investigar como a atividade tectônica influenciou o curso de rios e
afetou o padrão de distribuição das espécies aquáticas.
Desafios do BIOTA
Durante a abertura do workshop, o presidente da FAPESP, Celso Lafer,
realçou a importância de abordagens inovadoras e multidisciplinares
voltadas para a proteção da biodiversidade da Mata Atlântica. Ressaltou
ainda que a iniciativa está em consonância com os esforços de
internacionalização realizados pela FAPESP nos últimos anos.
“Uma das grandes preocupações da FAPESP tem sido o processo de
internacionalização, que basicamente está relacionado ao esforço de
juntar pesquisadores de diversas áreas para avançar no conhecimento.
Este programa de hoje está relacionado a aspirações dessa natureza e
tenho certeza de que os resultados serão altamente relevantes”, afirmou
Lafer.
Também durante a mesa de abertura, o diretor do IB-USP, Carlos
Eduardo Falavigna da Rocha, afirmou que o programa BIOTA-FAPESP tem sido
um exemplo para outros estados e outras fundações de apoio à pesquisa
em âmbito federal e estadual.
Carlos Alfredo Joly, professor da Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp) e coordenador do BIOTA-FAPESP, apresentou um histórico das
atividades realizadas pelo programa desde 1999, entre elas a elaboração
de um mapa de áreas prioritárias para conservação que serviu de base
para mais de 20 documentos legais estaduais – entre leis, decretos e
resoluções.
Joly também falou sobre os desafios a serem vencidos até 2020, como
empreender esforços de restauração e de reintrodução de espécies,
ampliar o entendimento sobre ecossistemas terrestres e sobre os
mecanismos que mantêm a biodiversidade no Estado e intensificar as
atividades voltadas à educação ambiental.
Para 2014, Joly ressaltou dois desafios na área de conservação.
“Estamos iniciando uma campanha para o tombamento da Serra da
Mantiqueira. Já fizemos alguns artigos de jornais, estamos lançando um website
específico e vamos trabalhar para conseguir tombar regiões acima de 800
metros, áreas apontadas como de extrema prioridade para conservação no
atlas do BIOTA”, disse.
Outra meta para 2014, segundo Joly, é trabalhar para que o Brasil
ratifique o protocolo de Nagoya – tratado internacional que dispõe sobre
a repartição de benefícios do uso da biodiversidade – até outubro,
quando ocorrerá a 12ª Conferência das Partes da Convenção sobre
Diversidade Biológica.
“É fundamental que um país megadiverso, que tem todo o interesse de
ter sua biodiversidade protegida por esse protocolo internacional, se
torne signatário do protocolo antes dessa reunião”, afirmou Joly.
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