Por Fred Furtado, do Rio de Janeiro
Agência FAPESP – Secas mais intensas, prejuízo na agricultura,
diminuição do pescado, reformulação da matriz energética – esses são
alguns dos impactos que as mudanças climáticas devem gerar no Brasil. E
os mais afetados serão os brasileiros de classes econômicas menos
favorecidas.
Esse é o cenário descrito no sumário executivo do Grupo de Trabalho 2
(GT2) do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas (PBMC), divulgado
sexta-feira (25/10) na Fundação Brasileira para o Desenvolvimento
Sustentável (FBDS), no Rio de Janeiro. O documento aborda os impactos
das mudanças climáticas nos sistemas naturais e socioeconômicos, bem
como suas consequências, além de opções de adaptação ao novo cenário.
“Esse relatório mostra que os impactos já estão acontecendo e é
preciso tomar decisões quanto a isso de imediato. Quanto mais se espera,
maior e mais caro fica o problema”, afirmou Suzana Kahn, pesquisadora
da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e presidente do comitê
científico do PBMC.
Para ela, o relatório também fornece elementos para que os
governantes brasileiros planejem suas respostas de maneira a diminuir os
impactos e os custos, bem como para melhorar a inclusão social. “Quem
sempre sofre mais e tem menos chance de se adaptar é a população pobre”,
declarou Kahn.
O primeiro sumário executivo do Relatório de Avaliação Nacional
(RAN1) do PBMC foi divulgado no dia 6 de agosto durante a 1ª Conferência
Nacional de Mudanças Climáticas Globais (Conclima), organizada pela
FAPESP, em São Paulo (leia mais em http://agencia.fapesp.br/17840).
Recursos hídricos
A água é um elemento-chave na questão dos impactos das mudanças
climáticas. Segundo o sumário divulgado na sexta-feira, as alterações
nos regimes de chuva devem levar a secas e enchentes mais frequentes e
intensas, podendo também ter impacto sobre a recarga de águas
subterrâneas.
As taxas de vazão dos rios também sofrerão variação. No leste da
Amazônia e no Nordeste, as perdas podem chegar a 20%, sendo que na bacia
do Tocantins o valor é de 30%. Já na do Paraná-Prata, a expectativa é
de aumento de 10% a 40%.
“É um problema muito sério. Segundo a Agência Nacional de Águas, mais
de 2 mil municípios terão problema de abastecimento de água em 2015”,
alertou Eduardo Assad, pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária (Embrapa) e coordenador do GT2.
Nas áreas costeiras, o aumento do nível do mar deve intensificar as
inundações e os processos erosivos. Além disso, o aumento da temperatura
e da acidificação dos oceanos deverá ter impacto negativo sobre os
ecossistemas marinhos e sobre a pesca.
“Podemos ter uma perda no volume de pescado de 6%, em média. Imaginem
quantas famílias de pescadores serão atingidas”, observou Assad. O
estudo prevê ainda a perda de biodiversidade em ecossistemas aquáticos e
terrestres, levando ao desaparecimento ou à fragmentação de hábitats .
Agricultura e energia
A atividade agrícola tende a ser afetada diretamente pelas mudanças
climáticas. Com o aumento da temperatura e a redução da quantidade de
água, áreas de baixo risco para a agricultura vão se tornar de alto
risco, perdendo valor e forçando a população rural local a migrar para
os centros urbanos.
“No Ceará, por exemplo, isso pode acarretar uma redução de até 60% no
produto interno bruto agrícola e no valor das terras”, ressaltou o
coordenador do GT2.
Outro problema sério são os efeitos sobre pragas e doenças que atacam
as culturas. A alta de temperatura e umidade serão condições ideais
para a eclosão de fungos.
Já o setor energético pode ser afetado de diversas formas pelas
mudanças climáticas. Segundo Assad, é necessário ampliar a matriz
energética, pois haverá problemas na geração de energia hidrelétrica em
razão das alterações na oferta de água.
Para ele, a abertura para alternativas energéticas mais limpas ainda é
tímida, enquanto há estímulo para fontes como gás de xisto e
termelétricas a carvão. “Onde estão os incentivos para as energias
solar, eólica e de marés? Continuamos insistindo na vanguarda do
conservadorismo energético”, destacou.
Cidades e saúde
As cidades também serão bastante afetadas, com alguns fenômenos já em
andamento, como os deslizamentos de encosta e os alagamentos causados
por deficiências no sistema de drenagem urbano.
“Não preciso lembrar o que vai acontecer em janeiro e fevereiro no
Rio de Janeiro e em Salvador. Nenhuma atitude foi tomada nos últimos
anos para resolver esse problema”, criticou Assad.
Em termos de transporte, o modal utilizado pelo país estaria
totalmente equivocado, principalmente o urbano, de acordo com o
documento. Mudar isso, especialmente no quesito transporte de carga,
faria o Brasil dar um grande salto na emissão de gases de efeito estufa.
Na questão de saúde humana, o país estaria extremamente vulnerável
por conta de ondas de calor e de frio, que estariam relacionadas a uma
maior mortalidade. Essas condições também podem ser ideais para a
proliferação de vetores de doenças tropicais, como mosquitos, levando a
uma expansão de males como a dengue.
Para o coordenador do GT2, reduzir os problemas relacionados à água,
bem como à subsistência e à pobreza são igualmente críticos. “Essas são
ações prioritárias que o Brasil tem que atacar. Para isso, governo,
indústria, comércio e sociedade precisam estar envolvidos em uma
resposta nacional adequada”, concluiu Assad.
Mais informações: http://www.pbmc.coppe.ufrj.br/pt/
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