Por Noêmia Lopes
Agência FAPESP – Os efeitos do aquecimento global no Brasil
provocarão deslocamentos de aves, mamíferos, anfíbios e outros animais
em direção a regiões com temperatura e umidade mais compatíveis às suas
necessidades, indicam estudos da Rede Brasileira de Pesquisa e Mudanças
Climáticas Globais (Rede Clima) em diferentes biomas.
“Em consequência dessa movimentação, nosso atual sistema de unidades
de conservação pode ficar obsoleto ou não muito eficiente”, afirmou
Alexandre Aleixo, coordenador da sub-rede Biodiversidade e Ecossistemas
da Rede Clima e pesquisador do Museu Paraense Emilio Goeldi (MPEG),
durante a 1ª Conferência Nacional de Mudanças Climáticas Globais (Conclima), ocorrida em São Paulo na semana passada.
Um dos grupos vinculados à sub-rede, formados por pesquisadores da
Universidade Federal de Goiás (UFG), debruçou-se sobre a situação de 431
espécies de anfíbios que habitam a Mata Atlântica e fez projeções para o
futuro (até 2080) a partir de três modelos climáticos.
Os resultados, publicados em artigo na revista PLoS One,
projetam uma redução de 72% na área atual de distribuição desses
anfíbios e a extinção regional de 12% das espécies. “Nesse cenário,
muitos dos animais terão de se dispersar para outros locais, uma vez que
as condições de temperatura e umidade já não lhes serão adequadas”,
explicou Aleixo.
O artigo também indica quais seriam os pontos prioritários do bioma
em termos de inclusão nos sistemas de conservação, a fim de oferecer
proteção às espécies que forem forçadas a se deslocar por conta das
mudanças climáticas.
Ainda sobre o bioma Mata Atlântica, uma segunda pesquisa apresentada
por Aleixo – um estudo feito por pesquisadores da Universidade Federal
do Rio de Janeiro (UFRJ), com base em análises estatísticas para 2050 –
revela o impacto das alterações no clima sobre a riqueza de espécies de
aves.
Considerando apenas o aumento de temperatura, 117 espécies podem
perder área de distribuição, seis podem entrar no grupo
de espécies ameaçadas e uma espécie pode ser extinta. Considerando o
aumento de temperatura e a ocorrência de desmatamento, os números sobem
para 120, 14 e dois, respectivamente.
“Também deve ocorrer movimentação entre as aves. Mas fica bastante
claro que não são somente os deslocamentos que preocupam – a
possibilidade de mais espécies ficarem ameaçadas requer atenção”,
afirmou Aleixo.
De acordo com o pesquisador, a situação é semelhante para outros
grupos de animais, em diferentes regiões do país, como exemplifica um
segundo estudo da UFG, que também resultou em artigo publicado na PLoS One.
Desenhando cenários sobre o impacto das mudanças climáticas na
distribuição das 55 espécies de marsupiais que ocorrem no Brasil,
concluiu-se que em 2050 a maioria das espécies pode ter uma redução
significativa de habitats adequados.
As taxas de movimentação, nesse caso, também seriam relativamente
altas, mas com variações ao redor do país. Os locais com clima atrativo
seriam alguns pontos da região dos Pampas, a porção sul da Mata
Atlântica, o norte do Cerrado e da Caatinga e o noroeste da Amazônia.
Já para o bioma Amazônia, diversos modelos climáticos preveem que o
setor de menor umidade, próximo a Tocantins, vai se tornar ainda mais
seco.
“As nossas previsões para 2020 e 2050 também apontam para um impacto
muito maior das mudanças climáticas no sul da Amazônia do que ao norte
da região, em função de variáveis ambientais e de altas taxas de
desmatamento. Podemos ter um colapso do sistema florestal no sudeste da
Amazônia, com imensos prejuízos para a biodiversidade”, disse Aleixo.
Esses e outros resultados da sub-rede Biodiversidade e Ecossistemas
contribuem para responder uma das questões norteadoras do grupo:
historicamente, ao longo da evolução das espécies, outras modificações
climáticas teriam contribuído para a aquisição de uma resiliência
natural por parte de alguns animais?
“Por enquanto, não temos indícios disso”, afirmou Aleixo. “As
evidências mostram que a fauna sofre com as grandes modificações – no
caso amazônico, particularmente com os processos de secamento da
floresta.”
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