Por Elton Alisson, de Recife
Agência FAPESP – O rápido aumento da temperatura da Terra,
observado no período atual, representa uma ameaça mais para a humanidade
em si do que para o planeta, que já passou e sobreviveu a diferentes
períodos de mudanças climáticas.
A avaliação foi feita pelo climatologista Ulrich Glasmacher,
professor da Universidade de Heidelberg, da Alemanha, na conferência que
proferiu sobre aspectos geológicos e sociais das mudanças climáticas
mundiais na semana passada, durante a 65ª Reunião da Sociedade
Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), em Recife (PE).
De acordo com o pesquisador alemão, o planeta experimenta períodos de
frio seguidos de ondas de calor há cerca de 450 milhões de anos. “O
Cretáceo (há mais de 100 milhões de anos), por exemplo, foi um dos
períodos mais quentes da Terra nos últimos 600 milhões de anos”, disse
Glasmacher.
Os níveis de emissão de CO2 na atmosfera naquela época também eram
muito altos, como pode ser observado em estudos com fósseis de formigas –
inseto que respira o ar e, em seguida, expira o oxigênio, retendo um
nível muito alto de CO em seu organismo –, explicou o pesquisador.
Há poucos dados, no entanto, sobre a atividade do Sol naquele
período, que influencia a temperatura da Terra e poderia fornecer pistas
de como será o clima do planeta no futuro, disse Glasmacher. “O que
podemos dizer é que, toda vez que houve um período muito frio [de glaciação] na Terra, ele foi sucedido por um período muito quente”, afirmou.
As mudanças climáticas pelas quais a Terra passou, contudo, não
colocaram em risco a sua existência e não causaram o desaparecimento em
massa de espécies, ressaltou Glasmacher.
Segundo ele, nenhuma das extinções em massa ocorridas no planeta foi
causada por mudanças climáticas, mas sim por vulcões, mudanças nas
placas tectônicas, meteoritos ou cometas. E, em todos os casos, o
planeta sobreviveu.
“Qualquer cenário previsto como fatal para o planeta é mentiroso e
tem o objetivo de causar medo. Por mais devastador que as mudanças
climáticas possam ser, a vida e o planeta vão sobreviver sem nós,
humanos”, disse.
“O planeta fez isso no passado, quando os dinossauros foram extintos,
e a vida na Terra continuou nos bilhões de anos seguintes. A questão,
agora, é se a humanidade conseguirá sobreviver às mudanças climáticas
globais”, ponderou.
Risco de extinção
Na avaliação de Carlos Nobre, secretário de Políticas e Programas de
Pesquisa e Desenvolvimento do Ministério da Ciência, Tecnologia e
Inovação (MCTI), o risco de as mudanças climáticas causarem o
desaparecimento do homem no planeta é, de fato, muito pequeno, uma vez
que os humanos desenvolveram capacidades cognitivas que os tornaram uma
das espécies mais adaptadas e adaptáveis da Terra.
Além disso, é muito improvável que a concentração de oxigênio no
planeta seja modificada nos próximos milhões de anos por efeito das
mudanças climáticas, a ponto de ameaçar a vida no planeta.
O problema é que as plantas só conseguem realizar fotossíntese sob
uma temperatura de até 48 graus. Se a temperatura média continental
atingisse essa faixa, haveria o risco de extinção em massa de espécies
por causa da quebra da cadeia alimentar, ressalvou Nobre, que foi o
apresentador da conferência de Glasmacher.
“Não que a temperatura média da Terra vá chegar a mais de 40 graus.
Mas, se isso acontecesse, haveria o risco de interromper a fotossíntese
das plantas e, com isso, o planeta seria muito diferente de hoje, com
menos vida e mais desértico – ainda que plantas do deserto
façam fotossíntese em um intervalo muito curto de tempo”, disse o
pesquisador, que é membro da coordenação do Programa FAPESP de Pesquisa
sobre Mudanças Climáticas Globais (PFPMCG).
Segundo Nobre, a maior preocupação sobre os possíveis impactos do
aquecimento global observado no período antropocênico atual, contudo,
não está relacionada ao valor final da temperatura suportada pelas
espécies (48 graus), mas à velocidade com que a mudança está ocorrendo, o
que poderá dificultar a adaptação de diversas espécies.
“Ter uma variação de cinco graus na temperatura em 200 anos, como
acontece agora no Antropoceno, é algo muito raro e não ocorria há muito
tempo. Muitas espécies não têm condições de se adaptar a uma mudança
climática tão rápida”, afirmou Nobre.
“Se a temperatura levasse um milhão de anos para subir cinco graus, a
extinção de espécies seria pequena. Já se isso acontecer em um período
entre 50 e 100 anos a extinção será muito grande. E, se ocorrer em um
prazo de 30 anos, 40% das espécies seriam extintas – o que, talvez, não
possa ser considerada uma extinção em massa, mas é uma perturbação de
uma dimensão que só meteoritos e vulcanismos causaram no passado”,
comparou.
Relatório do IPCC
Nobre, que é integrante do grupo 2 do Painel Intergovernamental sobre
Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), confirmou que parte do
quinto relatório de avaliação do órgão – intitulado AR5 – deverá ser
publicado ainda este ano.
“O primeiro relatório, do grupo 1, deve sair ainda este ano, enquanto
os relatórios dos grupos 2 e 3 serão divulgados em 2014”, disse Nobre à
Agência FAPESP.
“No final de setembro haverá uma reunião para aprovação do Summary for Policymakers”, contou o pesquisador, se referindo a um resumo do relatório, voltado para formuladores de políticas públicas.
O grupo de trabalho 1 avalia os aspectos científicos do sistema
climático e o fenômeno das alterações climáticas. Já o grupo de trabalho
2 examina a vulnerabilidade dos sistemas humanos e naturais impactados
pelas alterações climáticas, as consequências dessas alterações e busca
maneiras de adaptar-se a elas.
O grupo de trabalho 3, por sua vez, avalia o potencial para mitigar
alterações climáticas e limitar a emissão de gases do efeito estufa.
Nenhum comentário:
Postar um comentário